A natureza também ensina
- Quintal de Aruanda
- 17 de mai. de 2019
- 6 min de leitura

Quando eu era criança observava meu pai e meus avós que adoravam plantar e gastavam horas cuidando do quintal. Era o meu palco das imaginações, às vezes me imaginava em uma selva onde fingia ser o Tarzan, outras vezes, olhando para o arco formado pela proximidade dos dois pés de jabuticaba me sentia teletransportada para diferentes mundos e nessa convivência com as plantas resolvi fazer minhas experiências e plantar também, mas não dava muito certo, elas acabavam morrendo. Uma vez plantei um galho seco de laranjeira achando que dali cresceria uma árvore, meu pai olhou para minha empreitada e sorrindo me explicou que daquela forma não nasceria nada. Fiquei chateada, parecia tudo tão fácil...
Apesar de gostar das plantas eu também tinha meus momentos de destruição delas, meus avós ficavam loucos e eu me dava a correr. Com o tempo fui perdendo o gosto e me tachei incapaz de cultivar uma planta.
Anos mais tarde, quando ouvi falar sobre a Umbanda, resolvi conhecê-la, então um dia recebi um convite de um dos Pretos Velhos dessa casa para fazer parte da corrente mediúnica, eu nunca havia feito parte de uma antes e naquele momento achava que eu precisava saber de tudo ou ter um conhecimento prévio para fazer parte, aceitei o convite e fui fazer o processo de entrada e no meu último dia na consulência, por coincidência ou não, caí com a mesma entidade que me fez o convite e no final daquele atendimento ganhei um presente, simples, mas cheio de amor e boas intenções.
Quando percebi o que era, meu primeiro pensamento foi que não ía dar certo, pensei no por que daquelas duas sementinhas, fiquei feliz porque eu nunca tinha ganho um presente material das entidades, mas triste por achar que não iria dar certo dado meu histórico com as plantas. Eu agradeci e disse que temia que não fosse crescer nada, pois nada que eu plantava crescia, ele sorriu e respondeu: “-Será que essas também não vão crescer?” Eu sorri e ele continuou, “-E fia, planta quando estiver se sentindo feliz e não esquece fia, quando der flor, venha contar pro nego”.
Eu aguardava o momento para plantá-las, pois ele havia me orientado para plantá-las quando eu estivesse feliz. Meu primeiro aprendizado foi saber que eu não precisava ter vivido um êxtase de felicidade para plantá-las, que a felicidade vem e vai e que eu não preciso estar com a semente o tempo todo para plantá-las exatamente na hora em que eu estivesse feliz.
Com o tempo a planta começou a se desenvolver, eu ficava muito em cima, mudava de lugar e ela começava a morrer, voltava para o mesmo canto e também começava a morrer dado o sol forte. Eu ainda não havia descoberto qual planta era. Uma das sementes morreu. A outra se desenvolvia, percebi então que era uma trepadeira, confirmaram pra mim, pedi orientação a um dos médiuns sobre os cuidados, mas mesmo assim, essa pôr fim também morreu.
Fiquei triste e mais uma vez, considere coincidência ou não, por um curtíssimo tempo cambonei este mesmo Preto velho, que no final do atendimento, virou para mim e mostro-me um conjunto de sementes, onde escolheu uma e pediu para que eu escolhesse a outra, fiquei pasma e feliz porque teria outra chance, mas ainda receosa. Pensei mais uma vez que não ía dar certo, então a entidade me disse “-agora você sabe como cuidar, aprendeu com a outra quais eram seus hábitos e o que poderia fazê-la morrer. Então ele me disse “-E não esquece fia, quando ela der flor, venha contar pro nego”.
Eu não queria plantar no mesmo vaso, pensei que a terra deveria ser nova, o vaso também, pois o outro estava rachado e toda vez que eu aguava, escorria terra e tudo o mais que eu havia misturado nela. Eu pedi um vaso para um dos meus padrinhos e de brinde ganhei a terra também, fiquei agradecida, pensei, agora vai, terra nova, vaso novo.
Orei por aquelas sementinhas, escolhi um lugar onde o sol só batesse no final da tarde, pois havia percebido que ela era frágil e não suportava um sol intenso.
Passaram seis dias e nada, as duas últimas eclodiram da terra em cinco dias. Já estava ficando triste, mas resolvi não perder a esperança, era tudo novo, então os dias também seriam.
Dez dias depois, finalmente uma das duas brotaram, eu não havia perdido a esperança para a outra ainda, mas no 15° dia concluí que ela não nasceria. Logicamente pensei que a que não cresceu foi a que eu escolhi, nós humanos somos tolos de vez em quando.
Todos os dias eu ia lá e torcia por ela, cada folha que crescia eu ansiava pelo broto. Me perguntava como seria o broto, a flor e a cor. Um dia choveu e ventava muito, pensei na planta, como ela era frágil, eu não podia deixar ela sozinha naquele vendaval. O grau de saturação da terra também iria ultrapassar, naquela altura já devia ser uma piscina aquilo. Resolvi retira-la do lugar, foram 2 dias de chuvas intensas, e nesse tempo em que mudei ela de lugar a planta começou a murchar. Achei que era por causa de excesso de água, então pensei “não vai resistir”. No terceiro dia um pouco mais murcha fiquei triste. Seria mais uma morte? Então lembrei que ela não gostava de ser mudada de lugar, se adaptava fácil em um canto e se incomodava com a mudança. Imediatamente realoquei- a para o lugar dela novamente, e ela voltou a ter vida. Naquele momento pensei em como era difícil cuidar de uma planta e ter paciência.
Está aí, paciência, algo que eu não tenho, mas que perceptivelmente era e é algo importante eu ter e saber que as coisas acontecem no tempo que estão para acontecer, cada um tem seu tempo e não tem como você ter flor sem antes a planta brotar, ou até mesmo antes de plantar. Ter paciência porque a planta tem seu tempo mesmo que fossem da mesma espécie, pois as duas primeiras cresceram em 5 dias e as duas últimas apenas uma cresceu e levou 10 dias. Quatro sementes “iguais”, mas com suas peculiaridades.
Outra coisa que aprendi foi a ter Fé porque se não deu certo na primeira vez, uma hora vai dar certo, o importante é acreditar e não perder a esperança e que mesmo quando nos sentimos murchos e sozinhos, sempre existirá alguém ao nosso lado, olhando e cuidando de nós, como era o meu caso com a planta, ficando feliz em cada crescimento da mesma e zelando por cada obstáculo que ela enfrentava. E por fim aprender a desabrochar. Saber que você também tem seu tempo, tem sua caminhada, você precisa plantar e trabalhar em si parte por parte até um dia dar flor.
Quando finalmente a flor surgiu foi uma alegria e tanta. Foram 4 meses de ansiedade e expectativas e coincidiu com a primavera. A flor era bonita e fazia uma estrela no seu interior e a cor era branca, como a cor da fé. Ela era diferente, como aqueles cometas raros que só aparecem anos depois, só que no caso dela a sua aparição era só por um dia, daquelas que quem viu, viu, quem não viu, não vê mais.
Eu estava em êxtase, depois de pouco mais de um ano aguardando a flor, algo que parecia impossível, lá estava ela, estava tão emocionada que tirei uma foto para registrar aquele momento como a primeira planta que foi pra frente.
Após isso, fiz o que a entidade havia me pedido, comuniquei o surgimento da flor e contava maravilhada com a experiência as aprendizagens que foram surgindo no processo, ele me perguntou:
- Então fia, você aprendeu como desabrochar?
- Sim... contei o que havia aprendido e ele respondeu:
- Aaah fia... você já matou toda a charada, nego ía pedir pra fia juntar tudo isso que aprendeu e trazer pra vida. Mas é isso fia... agora nego vai te pedir um presente... se a fia puder... (rindo) Aquele que pede o presente né fia, mas se a fia puder dar uma sementinha pro nego quando ela der...
Então agora eu tinha mais uma missão, confesso que com essa eu ri um pouquinho porque depois que a planta deu flor, a mesma caiu e no seu lugar começou a inchar e virei pra minha mãe e disse:
- Acho que vem mais uma aí, mas tá estranho, inchou – ela riu e respondeu:
- Acho que são as sementes.
Então pensei, faz sentido, pois de onde mais elas iriam surgir?
Coincidência ou não, o broto que escolhi para entregar para a entidade continham três sementes, logo três sementes, o número de tentativas que não deram certo, cada uma recebeu por mim uma palavra para cada coisa que aprendi.
Fé, Paciência e Desabrochar.
E quanto a quarta semente, aquela que desabrochou e floresceu, dou o nome de Amor.
Salve as Almas Benditas!
Salve a Umbanda e todas as religiões!
Por: Um filho do Quintal.
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